CAPÍTULO
4
Hypollitus
Existe um tipo de pesadelo que não tem fim, é aquele
que começa quando a gente acorda e percebe que aquilo que aconteceu foi real,
não foi sonho... Esse é o pior dos pesadelos, porque não se pode acordar dele!
Meu Deus! Tudo aconteceu de verdade, não foi sonho! A minha festa, meus amigos
“normais” se despedindo mais cedo, a declaração oficial de que sou, ou melhor,
que somos todos bruxos... Aquela intrigante profecia que eu não sei de que se
trata... Tudo foi real!
Eu não queria me levantar da cama, mas a luz vermelha
do relógio digital no criado mostrava que já era nove horas da manhã e meus
pais já deviam ter se levantado.
Eu estava vivendo um grande paradoxo, pois, ao mesmo
tempo em que queria saber mais sobre minha vida (que, agora eu descobria, eu
não sabia nada), eu não queria enfrentar a realidade! Eu queria continuar lá, no aconchego do meu
quarto, na minha cama, com meu velho pijama...
Sem escolha, eu coloquei um leve vestido florido que
lembrava a primavera, talvez para expulsar o outono que havia tomado conta da
minha vida, prenunciando um inverno muito negro. Passei um batom combinando,
deixei os cabelos soltos e saí do quarto. Normalmente eu não me maquiava desse
jeito num domingo de manhã, mas, eu precisava desesperadamente de alguma coisa
para me animar.
Desci as escadas rumo à cozinha por pura falta de
opção. Quando eu cheguei, vi meu pai sentado à mesa junto com minha mãe e
Ambrosina. Eles estavam tomando café e na mesa havia leite, suco, cereais,
frutas, bolo de fubá, biscoito de queijo, restos do bolo de aniversário, pão de
queijo e queijo Minas meia cura. Mamãe servia suco à Ambrosina, que comia uma
fatia de mamão. Foi aí que eu me lembrei de que Ambrosina me disse ontem que
ela estaria com meus pais para me dar mais explicações.
_ Bom dia! _ eu disse.
Minha mãe se levantou e me deu um beijo amoroso. Papai
segurou a minha mão e Ambrosina me deu tapinha de leve na cabeça, enquanto
dizia:
_ Ânimo, querida! Hoje você vai entender tudo. E você
verá que as coisas não são tão ruins quanto você pensa. _ Será que ela havia
lido meus pensamentos? Quer dizer agora que alguém me diz que sou uma bruxa,
que minha família é toda bruxa e eu tenho que ficar feliz?
Como eu me recusasse a comer qualquer coisa, minha mãe
nos convidou para irmos conversar na sala, onde era mais confortável.
_ “Qual é a
pior coisa que eu posso viver?” _ eu pensei enquanto ia para a sala.
Surpreendentemente, nossa sala havia voltado ao
normal, com cada objeto de volta ao seu devido lugar. Por que eu ainda me
espantava? Isso era tolice agora!
Eu me sentei a um canto abraçando minhas próprias
pernas como na noite anterior. Aquela posição me acalmava.
Minha mãe e meu pai se sentaram à minha frente e Ambrosina
ao lado deles.
_ Então_ eu disse querendo parecer desafiadora _ vocês
podem começar a me dar as explicações agora.
Mamãe começou me explicando que a apresentação do
Poeira havia sido uma ilusão criada por papai. As fotos haviam sido urdidas,
pois, não havia sido uma apresentação real e todos os convidados se
“esqueceriam” dessa parte da festa. Os convites desapareceriam, por magia, da
casa de cada um dos convidados e essa manobra criada para atraí-los seria
esquecida. Papai se encarregaria de manipular a memória dos convidados que não
eram bruxos e eles se lembrariam da festa onde, segundo suas lembranças,
ficaram até de madrugada, quando, na verdade, começaram a ir embora às onze da
noite.
Meu pai também me explicou que, muitas vezes, quando
as pessoas normais assistem a algum fato onde a magia está envolvida, elas
enxergam como se tudo tivesse ocorrido de maneira normal, o que explica porque
ninguém percebeu o que aconteceu com a bola no dia do jogo na escola _ e
explica também que fui eu a responsável por tudo aquilo.
Quando eu perguntei ao meu pai o “por que” de toda
essa manobra, por que eu teria que ter uma festa badalada com praticamente toda
a cidade convidada, por que não poderia ser uma festa somente com os bruxos, já
que o objetivo único dessa festa era a minha iniciação no mundo bruxo, ele
respondeu evasivamente:
_ Ouça filha, nós precisávamos nos cercar de cautela.
Uma festa exclusivamente para o mundo bruxo levantaria muitas suspeitas e nós
não queremos isso. Você foi criada nessa cidade como uma garota comum, então,
seria normal que seu aniversário fosse comemorado por seus amigos e a festa
estivesse cheia de pessoas comuns. Para garantir a presença de todos os seus
colegas, criamos essa história da apresentação do Poeira na Estrada, que são os
ídolos da juventude!
_ Isso seria por causa da “profecia”?
_ O que você sabe sobre isso? _ minha mãe parecia
chocada ao perguntar.
_ Não muito. Sei apenas que houve uma profecia a meu
respeito quando eu nasci e vocês vieram se esconder nessa cidade, vivendo
pacatamente como pessoas normais e me criando como uma menina comum.
_ Sim. Eu e seu pai criamos você como uma garota comum
que chamasse o mínimo de atenção sobre si. Na verdade, como bruxa, você nunca
precisou de óculos, mas, nós manipulamos todas as suas consultas com a Dra. Maria
Emília para que ela acreditasse que você precisava realmente de óculos e os
receitasse para você.
“E eu usei aqueles óculos horríveis durante toda a
minha vida sem necessidade?” _ pensei. Ah! Eu queria morrer! Eu ficava ainda
mais feia com eles!
_ E o fato de eu não saber jogar vôlei, não saber
dançar, tudo isso foi manipulado também? _ eu fervia de raiva! Nessa hora, um
jarro de cristal se quebrou sobre a mesa de centro da sala (será que EU havia
feito aquilo?).
_ Filhinha, veja _ foi papai quem falou agora,
enquanto, com um gesto leve de sua mão, recompunha o jarro quebrado _ era
preciso que você ficasse protegida! Se fosse destaque no vôlei, nas artes ou
dançasse muito bem você chamaria mais atenção sobre si do que nós gostaríamos!
Era PRECISO que você ficasse o mais oculta possível!
_ Como a Princesa Aurora de “A Bela Adormecida”? _ eu
perguntei ironicamente _ Lembrem-se de que de nada adiantou ela ficar escondida
até seu aniversário. A bruxa malvada a descobriu assim mesmo e ela ficou
dormindo durante cem anos!
_ Sim, mas isso não significa que será assim para você
também. – Ambrosina falou muito séria.
_ Que profecia é essa? _ eu não queria, mas, minha voz
demonstrava toda a minha raiva. Afinal, eu havia passado a vida me sentindo um
patinho feio e desajeitado sem necessidade!
Uma ventania começou dentro da sala e foi logo
controlada por um único gesto da mão de Ambrosina.
_ Não foi sem necessidade! _ Ambrosina leu meus
pensamentos mais uma vez _ Acredite, não faríamos você passar por nenhuma
situação que lhe causasse sofrimento ou constrangimento se não fosse
absolutamente necessário para a sua segurança!
_ Vocês não vão me dizer que profecia é essa?
A ventania ameaçou chegar novamente e, de novo, foi
controlada por Ambrosina.
_ Existe uma bruxa muito antiga e muito sábia chamada
Avgar. _ disse Ambrosina _ Ela vive reclusa há mais ou menos cinquenta anos. No
dia do seu nascimento Avgar nos surpreendeu a todos ao sair da sua reclusão
especialmente para fazer uma profecia a seu respeito. Segundo ela, naquele
instante havia nascido a mais poderosa das bruxas, que seria a mais sábia de
todos os tempos.
“Eu, a mais sábia das bruxas?” Pensei. “Tem graça!”
Eu continuei ouvindo calada, esperando o fim daquela
história. E, sinceramente, eu estava tentando não provocar mais nenhum
acidente.
_ Depois de fazer a profecia a seu respeito _
Ambrosina continuou _ Avgar jamais foi vista novamente. Até hoje continua
reclusa, afastada da comunidade bruxa, vivendo nas montanhas como eremita.
_ Mas o que, exatamente, dizia essa profecia?
_ Um dia você saberá. _ era ainda Ambrosina quem
falava _ O que você precisa saber agora é que alguém ambiciona ocupar o meu
lugar de Mestra dos Bruxos há muito tempo. Alguém que já atentou contra a minha
própria vida.
Ambrosina se calou por um tempo que, para mim, pareceu
uma eternidade e, por fim, continuou:
_ Esse bruxo é também muito poderoso, de uma das mais
puras estirpes bruxas, mas, ele trilhou um caminho diferente do nosso, escolhendo
o Poder acima de qualquer coisa e é capaz de tudo para adquirir mais Poder...
Inclusive matar...
Mamãe estremeceu ao ouvir essa última frase e disse:
_ O nome dele é Hypollitus, um bruxo talentoso, cheio
de inveja e ciúme. Ele quer se tornar o Mestre dos mestres. Para isso ele fará
qualquer coisa.
_ Até me matar? _ eu perguntei com um arrepio de
horror.
_ Não pense nisso, filha. _ Meu pai queria parecer
mais controlado do que realmente estava. Afinal, eles não se esconderiam comigo
numa cidadezinha minúscula e me obrigariam a viver na obscuridade se algo muito
sério não estivesse acontecendo e esse “algo muito sério” teria que ser essa
profecia.
Esse era apenas mais um motivo para eu renunciar aos
meus poderes de bruxa.
_ O mundo bruxo cercou a sua vida de todas as magias possíveis
para que você permanecesse no anonimato, inclusive eu própria, que retive o seu
Poder até hoje, quando devolvi a você toda a sua energia. _ Ambrosina me deu uma pequena pista, nada
conclusiva.
_ E por que eu preciso que Erick fique comigo?
_ Erick é um grande bruxo, de uma linhagem
especialmente... Diferente. _ papai começou. _ Ele é apenas um pouco mais velho
que você e nasceu com o Grande Poder também, além de outros poderes próprios
dele que o restante do mundo bruxo não tem, nem mesmo você.
_ Há muitos anos ficou estabelecido (e ele sabe disso)
que ele seria o seu guardião quando isso se fizesse necessário, porque embora
você tenha um Poder excepcionalmente grande e forte, não foi criada como bruxa
e ainda não sabe o que fazer com todo esse poder. _ mamãe sentenciou.
_ Não preciso de varinha? _ Eu me senti idiota ao
perguntar isso. O vaso que se quebrou e a ventania mostravam que não era
necessário ter uma varinha.
_ A varinha é apenas um objeto criado para fazer as
pessoas do que não pertencem ao mundo bruxo entenderem o que é o Poder,
querida. _ mamãe me respondeu _ O que você precisa é somente se concentrar e
seu Poder fará acontecer. Nada mais. Porém, o seu Poder hoje é como uma caixa
de fósforos colocada nas mãos de uma criança pequena. Ela abre a caixa e acha
bonito ir riscando os fósforos, mas, não sabe como usar aquele fogo e acaba se
queimando e machucando outras pessoas ou causando um incêndio, ainda que não
queira. Porém, você não deve se preocupar porque logo aprenderá a se dominar.
_ Sua mãe, eu, Erick e Ambrosina estaremos ao seu lado
para impedir que você coloque fogo na casa ou na escola _ papai brincou.
Eu não achei graça nenhuma na possibilidade de colocar
fogo na casa sem querer. Isso reforçava a minha hipótese de que deveria me
manter afastada de Bernardo e de Sissi se quisesse protegê-los. Agora eu sabia
que eu deveria protegê-los não só das minhas trapalhadas, como também desse
bruxo, Hypollitus, que não hesitaria em fazer picadinho dos meus amigos.
_ Há mais alguma coisa que você queira saber, filha? _
mamãe demonstrava realmente preocupação ao me olhar.
Havia tanta coisa para perguntar... Muita coisa era
falta de percepção da minha parte: Nossa casa estava sempre bem arrumada e a
comida deliciosa era servida nos horários certos, embora eu raramente visse
minha mãe limpando ou cozinhando e não tivéssemos empregada (certamente não
seria muito conveniente manter uma empregada numa casa de cheia de bruxos).
Agora eu podia perceber que, na verdade, minha mãe
nunca fez nenhum trabalho doméstico e o que eu a via fazer era somente para me
despistar. Era também muito estranho o fato de minha mãe ser a esposa de um
médico e não ter sequer uma faxineira, mas, eu nunca havia percebido isso.
Apesar de tudo, não quis perguntar mais nada.
Outra coisa que deveria ter-me chamado a atenção é
sobre o nosso alto padrão de vida. É lógico que meu pai devia ter um ótimo
salário, afinal ele era médico, mas, nós tínhamos um padrão elevado demais para
uma família que se mantinha apenas com a renda salarial de um médico do
interior.
Mesmo com todas as dúvidas, eu não quis entrar em
detalhes, então, apenas balancei a cabeça:
_ Não. _ eu estava ainda meio atordoada com tudo
aquilo. Meu Deus! Minha vida havia virado de ponta-cabeça!
_ Ah! Eu tenho, sim, uma dúvida! _ eu disse meio
insegura.
_ Sim? _ Ambrosina me olhou com interesse.
_ E sobre... Deus? _ mais uma vez eu me sentia
ridícula nas minhas perguntas.
Foi papai quem falou:
_ O que exatamente você quer saber sobre Deus?
_ Onde fica Deus nesse meio todo, onde existem bruxos,
vampiros, sereias, lobisomens... _ eu continuava me sentindo ridícula.
_ Deus continua sendo o que sempre foi: O princípio e
o fim de tudo, o Criador que deve ser adorado e respeitado por todas as
criaturas.
_ Mas... E o mal?
_ Deus criou o mal? _ papai emendou _ O mal vai
continuar no coração das criaturas. Deus continuará a proteger quem se mantiver
no caminho do bem, quem se preocupar com o seu semelhante, pois, ainda que
sejamos criaturas diferentes, fomos criados pelo mesmo Criador e Deus é Amor!
Respondi sua pergunta?
_ Sim, pai, obrigada, embora eu saiba que vou ter
muito mais perguntas.
Ambrosina me surpreendeu com mais uma revelação sobre
a vida dos bruxos quando disse:
_ Apenas para que você se situe Carol, saiba que eu já
sou a Grande Mestra há trezentos e trinta anos!
_ O quê? _ Ambrosina parecia ter mais ou menos setenta
e cinco anos, não mais. _ E Erick, quantos anos tem?
Apesar de a situação ser um tanto delicada, todo mundo
riu do meu espanto.
_ Erick tem dezenove anos, meu amor. _ Minha mãe falou
gentilmente. _ Do nosso círculo de relacionamento, os mais velhos são
Ambrosina, que tem trezentos e quarenta e seis anos e a família de Methe, outro
grande amigo que, infelizmente, não veio à sua festa. As idades dos três membros
da família dele somam mais de seiscentos anos.
_ O tempo conta um pouco diferente na vida dos
bruxos._ minha mãe acrescentou.
_ Um pouco
diferente? _ eu perguntei ironicamente.
_ Até os cinquenta anos o tempo é normal para nós. _
meu pai continuou como se não percebesse a minha ironia _ Eu tenho quarenta e
dois anos e sua mãe tem trinta e seis, do mesmo jeito que você acabou de
completar dezesseis. Mas, para o nosso corpo, a partir dos cinquenta anos, cada
dez anos contam como se fosse um ano. Dessa forma, é como se Ambrosina tivesse
setenta e nove anos, que são cinquenta, mais duzentos e noventa e seis que,
para o seu corpo, são pouco mais de vinte e nove anos, entendeu?
_ Quer dizer, então, que você só completará cinquenta
e um anos quando, na verdade, tiver sessenta?
_ Meu corpo entenderá que sim e eu terei somaticamente
a aparência de cinquenta e um e não de sessenta anos, da mesma forma, quando eu
completar setenta anos, meu corpo terá a aparência de cinquenta e dois.
_ Isso é, no mínimo, curioso. _ eu refleti, tentando
não pensar muito sobre esse estranho mundo que eu estava descobrindo.
_ Se tiver qualquer outra pergunta, não hesite.
Procure qualquer um de nós. _ Ambrosina falou.
_ Foi bom a senhora ter falado nisso. Como é que Erick
vai ser meu guardião? _ por mais que eu tentasse controlar a minha raiva, não
pude evitar que um quadro saísse voando da parede. Papai foi rápido dessa vez,
recolocando o quadro de volta ao seu lugar. Ele tentou, mas não conseguir
esconder um meio sorriso. Ele estava se divertindo com as minhas trapalhadas!
_ Robert e Charlotte compraram uma casa aqui. Robert
será apresentado por nós aos nossos amigos como um parente distante que
escolheu vir morar aqui para que sua família vivesse em paz, mas que continua,
ele próprio, trabalhando em uma multinacional inglesa em Belo Horizonte, vindo
aos finais de semana. Erick se matriculará amanhã na sua classe e ficará junto
de você todo o tempo. Vocês terão, para todos os efeitos, pouca diferença de
idade.
“Amanhã... Na MINHA classe?” _ pensei. Caraca! Isso
seria pior do que eu imaginava! Eu achava que não iria conseguir conviver com
Erick tão perto de mim, uma vez que ele me deixava tão desconcertada. E havia
ainda aquele sonho... E a lembrança daquele beijo...
_ Peraí gente _ eu comecei, olhando para cada um deles
_ eu agradeço muito essa história de poder, mas, eu não posso aceitar isso!
Tipo, eu NÃO QUERO ser bruxa, vocês estão me entendendo? Vocês podem pegar o
meu poder de volta, é sério, eu não vou sentir a menor falta dele já que vivi
até hoje sem ele!
Mamãe pegou a minha mão, balançando a cabeça e
sorrindo. _ Carol, minha querida, nós compreendemos que tudo pode estar sendo
muito difícil para você nesse momento, mas, não é assim tão simples! Você não
pode simplesmente decidir “não quero ser bruxa” e imaginar que tudo voltará a
ser como antes.
_ Não?
_ Não. _ ela disse simplesmente _ Ser bruxo não é uma
coisa que se escolhe, a pessoa nasce assim e pronto. O Poder que lhe foi
retirado por Ambrosina pertence a você, somente a você e ninguém pode fazer uso
dele. Ainda que Ambrosina não o tivesse devolvido, o Poder é tão forte que
voltaria para você, mesmo que ninguém fizesse nada para isso. Se o Poder
voltasse para você sem ter sido devolvido por Ambrosina, ele voltaria de uma maneira
descontrolada e só Deus para dizer o que aconteceria.
_ Oh! _ foi tudo o que eu consegui dizer. Quer dizer
então que eu estava acorrentada para sempre a esse destino? Não podia escolher
ser diferente? Eu pedi licença e subi lentamente as escadas rumo ao meu quarto,
naquelas últimas horas era somente lá que eu me sentia confortável. Bernardo
jamais iria entender a presença constante de Erick ao meu lado, ainda que ele
fosse apenas “meu parente”.
Aquele domingo parecia não ter fim. Inexplicavelmente,
eu estava morrendo de saudades de Bernardo. Ele havia ficado de telefonar mais
tarde. Isso estava fora de cogitação agora. Eu teria que mantê-lo afastado. Meu
Deus! Ele jamais iria entender meu comportamento, passaria a me odiar com a
presença constante de Erick ao meu lado. Ele iria pensar que eu não o queria
mais, que o estava deixando por causa de Erick! Na verdade, eu não o queria
mesmo, mas, não queria que fosse assim, eu esperava ter mais tempo para
conseguir ajeitar tudo sem traumas.
Ah! Por que a vida tinha que ser tão injusta assim? As
lágrimas corriam livremente sobre meu rosto e eu não me preocupava em
limpá-las. Tudo o que estava acontecendo parecia surreal! Como, de uma hora
para outra, alguém pode descobrir que toda sua vida foi uma mentira? E que tudo
aquilo que nos foi contado durante toda a nossa vida como se fossem simples
histórias da carochinha era verdade?
Como se não bastasse eu descobrir que toda a minha
vida foi baseada em mentiras, que eu nunca fui a pessoa que eu achava que era,
que nem óculos eu precisava usar, eu ainda descobria que bruxos existiam de
verdade e, pior, que, eu era um deles!
Ainda havia Hypollitus! Quem seria esse sujeito? Qual
seria a sua relação com a profecia sobre mim? Enquanto queimava mais neurônios
tentando decifrar o indecifrável, acabei adormecendo e tive um sono tumultuado.
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